quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

AC/DC - SP, Dez 2009



                                           Foto: Patrícia Fanaya


Eu fui - confesso que mais por causa da minha filha do que por mim mesma. Desconfio um pouco de velhinhos saltitando e berrando pra lá e pra cá. Gosto do som dos caras. Sempre gostei. A desconfiança é em relação `a idade mesmo. Shows em estádios lotados não combinam com senhores barrigudinhos,  carecas e, vamos lá, acabadinhos em função de uma vida cheia de excessos. Entretanto, essa é uma posição muito pessoal - minha filha, que está sendo devidamente iniciada nessa vida de shows, não compartilha dela.
Bem, vamos aos pontos positivos: a pontualidade foi britânica - `as 21h e 30min o show começou, o que é bastante incomum em shows de rock, ainda mais em estádios. A multidão de chifrudos-vagalumes urrava em êxtase. O palco estava bem arrumado e a luz, impecável. O filme de animação que rolou nos telões foi muito bem produzido. A lista das músicas já havia sido motivo de muitos comentários em sites especializados e na blogosfera: alguns defenderam a seleção conservadora e repetitiva do grupo e outros se revoltaram de o repertório ser sempre o mesmo, por anos a fio. Pessoalmente, tendo a defender a posição conservadora: acho que a grande maioria das pessoas vai aos shows para ouvir (e, no Brasil, em especial, cantar muito!) os sucessos do passado; músicas novas e desconhecidas, em shows, costumam causar uma baixa de energia e uma certa dispersão na galera.
Quanto aos pontos negativos...bem, para uma pessoa experiente e com um mínimo de ouvido, o som estava péssimo. Os instrumentos se embolavam com a voz de Brian Johnson, o que fez com que, em muitos momentos, se demorasse a entender que música estava sendo executada. Conforme o tempo ia passando, o som ia sendo ajustado. Imperdoável, na minha opinião, que uma banda desse calibre não tenha acertado o som antes do show. Achei uma vergonha e, disparado, o que houve de pior em todos os shows desse porte que eu já assisti - e olha que não foram poucos. Outra coisa que me incomodou foi constatar que, apesar dos esforços de Angus Young, a banda fez um show burocrático, 'by the book', sem entusiasmo e sem comunicação com o público. No final, o bis (que nem foi tão pedido assim) foi de duas músicas e pronto. A multidão foi se dispersando sem insistir nem um pouco para que a banda voltasse ao palco.
Para minha surpresa, no dia seguinte, os jornais de maior circulação e os portais na internet foram só elogios e nada mais. Sei lá, acho que estou ficando velha e exigente demais; ou será que não se pode mais fazer críticas por aqui?
Ainda assim, acredito que uma banda como o AC/DC que já vendeu cerca de 200 milhões de cópias em todo o mundo; que produziu um álbum como Back in Black, que vendeu até hoje cerca de 43 milhões de cópias em nível mundial, fazendo dele o 2º álbum mais vendido de todos os tempos e o 5º mais vendido nos Estados Unidos; que ficou em quarto lugar na lista da VH1 dos "100 Maiores Artistas de Hard Rock; e que foi considerada pela MTV a 7ª "Maior Banda de Heavy Metal de Todos os Tempos", deve saber o que ainda pode fazer. Ou não.

domingo, 25 de outubro de 2009

A vida das crianças de 3 culturas

Fonte: www.estadao.com.br

Aos 4 anos, Ethienne decidiu: é palmeirense. O irmão mais velho, Christopher, de quase 6 anos, é são-paulino convicto. Consenso mesmo só na seleção. Eles respondem em um português claro que é o Brasil. Mudam de assunto e seguem a conversar em inglês com o pai, Paul Groom, sobre o desenho sensação do momento, Ben 10. E falam em francês para a mãe, Dominique, sobre o programa infantil Cocoricó. Essa mistura de culturas e idiomas é o que configura uma típica família com Third Culture Kids (TCKs, crianças de uma terceira cultura, na sigla em inglês). Nesse caso, pai inglês, mãe francesa e filhos brasileiros, mas trilíngues.


A expressão TCK foi criada há 40 anos por Ruth Hill Useem, estudiosa de crianças americanas que viviam na Índia. "São pessoas que passaram a maior parte da infância e adolescência longe da cultura de seus pais. Um TCK constrói relações com várias culturas, embora não tenha ligação forte com nenhuma", diz a definição do site TCK World, um dos vários que reúnem jovens com esse perfil pela África, Ásia, Europa e América. Com o crescimento econômico, o Brasil entrou nessa rota de expatriados.

Paul, consultor financeiro, conheceu a executiva Dominique no Rio, em 1999, quando visitavam o País a negócios. O inglês já era pai de outros três filhos, que moram nos Estados Unidos. Ele também tem cidadania americana. Por isso, os filhos com Dominique têm nada menos do que quatro nacionalidades. "O custo para manter tantos passaportes é altíssimo", diverte-se Paul.

As despesas com a vida internacional vão além. Só neste ano, a família Groom já viajou para o exterior cinco vezes. Três para os EUA e duas para a França, onde os meninos passam o tempo com os avós maternos e primos, familiarizando-se com a cultura da mãe e treinando o francês, que ambos falam sem sotaque. "Temos obrigação de ensiná-los sobre as características de nossos países."

Estudiosos dizem que, por um lado, os TCKs têm a vantagem de falar vários idiomas, conhecer diversas culturas e se adaptar facilmente a novos ambientes, o que ajuda na carreira profissional. Por outro, sofrem com a falta de raiz, com as dificuldades de ter de fazer novos amigos sempre e de não ter um lugar que possam chamar de casa, dizem David Pollock e Ruth Van Reken (ela própria uma TCK), autores do livro Third Culture Kids: The Experience of Growing Up Among Worlds.

Para amenizar alguns efeitos negativos, muitos pais procuram escolas internacionais. A francesa Isabelle Stalker e seu marido americano, Jason Stalker, executivo de multinacional, fizeram essa opção. Matricularam Priscilla, de 8 anos, e Allan, de 5, ambos brasileiros, em uma escola americana, a Chapel School, que tem 700 alunos de 30 nacionalidades diferentes. "A escola internacional é um lugar de acolhimento para TCKs", diz Isabelle, professora de francês, que dá como certa uma nova mudança de país dentro de três anos. "Allan é um garoto mais internacional, por ser mais novo. Priscilla se sente brasileira acima de tudo."

"Os TCKs são as crianças do futuro, porque falam vários idiomas e entendem outras culturas", diz Isabelle. O diretor da Chapel School, John Ciallelo, concorda. "TCKs veem o mundo com uma perspectiva diferente, mais ampla. E, de certa forma, todas as crianças estão se tornando TCKs por conta dos avanços tecnológicos que as colocam em contato com o mundo inteiro."

Kelly Piquet, filha do tricampeão mundial de Fórmula 1, Nelson Piquet, e de uma holandesa, também é TCK. Ela cresceu entre Monte Carlo, Oxford e Brasília e hoje faz universidade em Nova York. "Eu me sinto em casa quando estou na Holanda. Mas também sinto falta do Brasil e de Mônaco", diz a estudante de Relações Internacionais, que foi alfabetizada em francês.

DE LUGAR NENHUM

O Departamento de Estado dos EUA, com funcionários deslocados para outros países e casados com pessoas de outras nacionalidades, criou uma página na internet sobre crianças de terceira cultura para orientar os pais a criar os filhos. "TCKs tendem a ter mais em comum com seus pares do que com os que não tiveram experiências internacionais", diz o Departamento de Estado, acrescentando que "eles demoram para estabelecer uma identidade".

O filho de um diplomata americano, mantido anônimo pelo Departamento de Estado, escreveu em um artigo que se tornou uma espécie de "tratado dos TCKs", que eles cresceram "sem serem locais" de nenhum lugar. "Pertencemos a uma terceira cultura."

Aiza Blinder, filha do jornalista brasileiro Caio Blinder com uma filipina, é outro exemplo. Em entrevista ao Estado, apesar de fluente em português, pediu para responder às perguntas em inglês porque se expressa melhor nessa língua. "Tenho a vantagem de viver em New Jersey, onde muitas pessoas são como eu", afirma ela, que viaja todas as férias para o Brasil. "Hoje, com o Facebook, consigo manter minhas amizades em outras partes do mundo."

"Quando se é hóspede em um país, não há espaço para arrogância ou para achar que o seu país é melhor", diz Olivier Weber, alto executivo suíço casado com uma dominicana, e que mora no Brasil. Ele tem dois filhos, Alexander, dominicano, e Jessica, brasileira.

Mãe de uma criança de terceira cultura, Paula Homor resolveu lançar um blog bilíngue para ajudar os pais estrangeiros que criam filhos em Nova York. Ela é brasileira, o marido austríaco e teme que a filha, hoje com 2 anos, não escreva bem em nenhum idioma.

John Ciallelo, da Chapel School, admite que o aprendizado de muitas línguas pode ser difícil e frustrante. Mas lembra que crianças assimilam novos idiomas rapidamente. "Além disso, um TCK tem outras facilidades, como sua sociabilidade." Para não haver dúvidas das habilidades de um TCK, basta lembrar que o presidente dos EUA, Barack Obama, é nascido no Havaí, filho de um queniano com uma americana.

sábado, 12 de setembro de 2009

Fotógrafo andarilho de um planeta não revelado


Sebastião Salgado finaliza o ambicioso projeto Gênesis e fala da arte que tem como ofício.

Laura Greenhalgh, de O Estado de S. Paulo

Sebastião Salgado tem o mundo impresso na memória. E pode comprovar isso. Aos 65 anos de idade, 36 deles dedicados à fotografia, cruzou o planeta em todas as direções, inclusive emburacando-se pelos lugares mais recônditos, para compor este que já é certamente um dos maiores acervos autorais de imagens de que se tem notícia. Mas Sebastião Salgado, pasmem, garante na entrevista a seguir que está ficando velho. E que um dia pode parar de fotografar. A previsão surpreende na voz que ainda se exalta, e se transporta, ao explicar as andanças pelo mundo em busca de rostos, gestos, corpos, lugares. "Para fazer fotografia documental é preciso ter sempre a ‘vontade de ir’. E eu tenho."

Em 2004, este mineiro de Aimorés, famoso no mundo inteiro pelo que vê e dispara de sua Leica (depois pôs-se a fazer o mesmo da Pentax e agora da Canon) anunciou que passaria oito anos fotografando lugares prístinos, ou seja, paraísos terrestres habitados por agrupamentos humanos cujos laços com a natureza são ainda primordiais. E que o projeto receberia o batismo bíblico de Gênesis. Pois a empreitada vai chegando ao fim. Prestes a embarcar em um navio para a Geórgia do Sul, contornando as Malvinas, Sebastião Salgado - Tião para os próximos - está quase no fim da série de 32 reportagens fotográficas por cinco continentes, numa geografia estranha aos roteiros turísticos convencionais. Longe disso: o economista que se bandeou para a fotografia aos 29 anos, hoje admite escalar a antropologia visual.

Não o faz sozinho. Tem a seu lado a arquiteta Lélia Wanick Salgado, a Lelinha, para Tião, mulher, mãe de seus dois filhos e "minha sócia na vida". Isso diz tudo. Foi com a Leica de Lélia que começou a fotografar nos anos 70 (ambos estudavam e moravam em Paris). Foi com o apoio de Lélia que trocou de profissão (era economista da Organização Internacional do Café e decidiu procurar emprego em agências fotográficas como Gamma, Sigma e Magnum) e foi com Lélia que montou, nos anos 90, a Amazonas Images, especializada em Sebastião Salgado. É Lélia quem edita os livros de fotografia dessa grife consagrada - entre eles, Trabalhadores, Terra, Êxodos e tantos outros - assim como é Lélia quem arquiteta e controla a montagem de exposições do marido pelo mundo (dentro de alguns dias vai inaugurar uma em Tóquio). Por muito menos, Lelinha já seria "a mulher de verdade", como diz o samba famoso, só que tem mais: ela preside o Instituto Terra, um vasto e bem-sucedido projeto ambiental, concebido com o marido na região do Vale do Rio Doce.

Da experiência direta com o ambientalismo veio a vontade de fotografar o planeta em lugares onde poucos pisaram, como explicará Sebastião. Gênesis estará concluído no ano que vem e, a partir daí, começam exposições de imagens do projeto que, a depender da vontade do casal Salgado, serão eventos ao ar livre, em grandes parques, por várias capitais do mundo. As fotografias também serão tema de um filme de Wim Wenders, com trilha do jovem compositor americano Jonathan Elias. Nestas páginas, quatro imagens dão apenas uma amostra do que vem por aí. Como o grupo de índios Zo’e, do Pará, povo que hoje não chega a 280 pessoas - vistos na mata, com seus cocares brancos, em fotografia jamais divulgada. Cenas de uma beleza desconcertante para ‘ocidentais’ tão domesticados.

Você tem dito que o Gênesis é seu último grande projeto fotográfico. Por que estabelecer o limite?
Digo que é o último projeto desse porte. Falo de projeto que leva anos para se concretizar, com viagens às vezes muito duras, desafios como o de andar 850 quilômetros até chegar a um determinado ponto. É preciso estar muito motivado e ter enorme disposição para encarar tudo isso. Não que eu vá parar de fotografar, mas encarar projetos nessa escala já pesa na minha idade. Tento me manter em forma, faço ginástica todos os dias, cruzo Paris de bicicleta, só que chega aquela hora em que o joelho começa a não querer obedecer. Como também vai chegar a hora em que vou preferir editar o meu material, talvez esse seja o trabalho mais importante que eu tenha pela frente. Sempre trabalhei muito, produzi um volume incrível de imagens. Tenho mais de 500 mil cópias de leitura, fora a imensidão de negativos que ainda não mexi. E uma imensidão de fotos paralelas.

Como assim?
Por exemplo, Lélia e eu começamos a editar nossas fotografias de família, material feito ao longo das nossas vidas, com nossos meninos crescendo. Então, penso um dia trabalhar no meu acervo, considerando que a idade vem chegando, que eu posso vir a me repetir e que os novos fotógrafos estão aí, vamos deixar lugar para eles. Tenho pensado nisso tudo. Inclusive na pertinência dos meus trabalhos. Falo de pertinência histórica, ideológica, pessoal. Hoje só faço aquilo com o qual tenho profunda identificação.

De que suporte financeiro você dispõe ao fazer um projeto das dimensões do Gênesis?
Temos o suporte de várias publicações: Rolling Stone, Paris Match, Guardian, La Republica, entre outras. Temos o apoio financeiro de duas fundações americanas, como também da Vale, nossa parceira de longa data. Agora mesmo vou passar dois meses na Geórgia do Sul e vem sendo montado um barco para essa reportagem, partindo das Malvinas. São viagens caras desde a fase da preparação. Quando comecei a propor projetos de três, cinco anos, os parceiros não entendiam bem. Hoje creio que ganhamos credibilidade. Quando falo para esses veículos que passarei oito anos fotografando e que, de tempos em tempos, eles terão minhas reportagens, ninguém duvida de que isso aconteça.

Depois de ter fotografado intensamente nestes últimos 36 anos, de propaganda de carro à vida dos garimpeiros, como é que você definiu o escopo do Gênesis? Por que buscar os lugares intocados do planeta?
A ideia do Gênesis nasce da experiência no Instituto Terra, uma reserva ambiental que começou a surgir no momento em recomprei as terras que foram da minha família, na região do Vale do Rio Doce. Ali passamos a lidar com o tema da biodiversidade, já optando pelo reflorestamento de uma área que estava bem degradada. As primeiras 500 mil mudas foram doadas pela Vale, com quem também nos associamos para fazer um programa de educação ambiental de longo alcance, o Terrinha. Lá na região, replantamos 1,5 milhão de árvores. Então, foi lidando com esse tipo de coisa que bateu a vontade de fotografar o planeta. Desenvolvemos um conceito, elaboramos o projeto fotográfico e fomos embora. Lélia e eu fizemos um sem-número de leituras, procuramos organizações ambientalistas pelo mundo. Por exemplo, grande parte da pesquisa foi feita nos arquivos da Conservation International, em Washington. Trabalhamos ainda com o Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas, em Nairóbi, e com a Unesco. Quando iniciei o projeto por Galápagos, em 2004, estava tudo planejado para os anos seguintes.

E por que Galápagos? Tem a ver com Darwin?
Exatamente. Eu tinha vontade de entendê-lo. Já havia lido a teoria da evolução das espécies, sobre a viagem do Beagle, mas lá em Galápagos, hoje um patrimônio da humanidade, fica muito mais fácil compreender Darwin. Porque é possível conferir, visualmente, como uma determinada espécie se desenvolve de maneira diferente de uma ilha para outra. Em Galápagos você tem um microcosmos que retrata o universo. Acabei ficando por lá mais tempo do que o próprio Darwin. Ele passou 47 dias lá, eu passei 90. Tive autorização da Fundação Charles Darwin e do Parque Nacional de Galápagos para visitar todas as ilhas do arquipélago.

O que você privilegia no Gênesis: o homem, o bicho ou a natureza?
Ainda é o homem. Se você imaginar que 30 a 40% do projeto são fotos de pessoas e que a natureza tem muito, muito mais espécies, então o humano prevalece. Fotografei agrupamentos que vivem, em relação ao planeta, naquele mesmo equilíbrio dos tempos primordiais. Este foi o meu critério, por isso desisti de fotografar comunidades esquimós no Alasca ao ver que vários grupos já caçam com rifle e há chefe esquimó que tem até avião particular.

Afinal, encontrou esse humano 100% "in natura"?
Há vários grupos assim. Os mentawai, que vivem na ilha de Sumatra, na Indonésia, ainda mantêm uma relação tão forte com a natureza a ponto de fazê-la "deus". É preciso pedir permissões à natureza o tempo todo. Quando fotografo essas pessoas, às vezes preciso isolá-las do contexto para fazer um bom retrato. Posso improvisar um estúdio na mata com folhas, ou tecidos, fundos relativamente neutros. Pois para fazer um estúdio precisei tirar algumas palhas das casas mentawai. Tivemos que pedir autorização "divina" e a resposta só veio depois que a comunidade leu o futuro nas tripas dos animais, como é a tradição. Daí uma cobra entrou na nossa casa e meu assistente teve que matá-la. Pronto, os mentawai não gostaram, porque seria um aviso de que as coisas não estavam indo bem. Eles atravessam hoje um estágio evolutivo interessantíssimo: estão agora domesticando plantas e animais. Trabalhei também com os chamados bushmen, de Botswana e da Namíbia, que vivem como há 50 mil anos. São coletores-caçadores.

Sempre viaja com intérpretes?
Sim. No caso dos Zo’e, no Pará, fui com uma estudiosa da língua deles.

Existe um estranhamento quando você trava o primeiro contato com um humano que vive num estágio evolutivo tão remoto e diverso do seu?
Não. Primeiro porque, mesmo que demore um certo tempo, acabo sendo aceito ali. Como com o grupo, durmo onde o grupo dorme, me desloco com ele, enfim, passo a fazer parte desse núcleo. As reações, a maior parte delas, são previsíveis, porque são humanas, ainda que não se entenda uma conversa feita na base de estalos de língua. Eu nunca vi relações tão amorosas com os filhos quanto em grupos coletores-caçadores. Nos Zo’e, por exemplo, não existe o conceito do "não" para pôr limites nas crianças. Um dia eu estava fotografando e o indiozinho não parava quieto, não me deixava em paz, pulava pra cá, pra lá, derrubava coisas... daí eu pedi à intérprete que falasse com a mãe dele. A intérprete hesitou, mas falou. E a mãe ficou desesperada, porque não sabia me atender naquilo que eu pedia. Entre estes índios, padrões de comportamento mais maduros e responsáveis se desenvolvem naturalmente, à medida que pessoas crescem e envelhecem.

Você mostra as fotos que faz dessas pessoas para elas próprias?
Para os Zo’e cheguei a mostrar no visor da máquina digital. Para outros grupos, não, e nem terei como mandar as fotos, pois são nômades. Os índios adoraram, pois, como em todos os grupos visitados, sem exceção, demonstram grande preocupação com a estética. As mulheres, todas, andam com um espelho. E a todo momento arrumam o cocar de penas de urubu branco.

Mas são índias com espelho?
A Funai deu para eles quatro instrumentos de branco: o espelho, do qual as mulheres não desgrudam, lanterna, facão e faquinha. O caso da lanterna é interessante: porque ela já vem com pilhas e a Funai só dá outras mediante a entrega das velhas. A lanterna foi de grande ajuda, pois havia muita picada de cobra em caçada noturna.

Você se refere ao seu trabalho como reportagem e fala das fotos como documentos. Qual é o limite entre a foto documental e a foto artística?
O que é artístico? Eis o problema. Recentemente vi uma exposição de arte africana em Barcelona, num belo museu. A maioria das obras era de uso cotidiano, cestas, jarros, ferramentas agrícolas, peças que são vendidas por milhares de euros. Vá conferir no Museu d’Orsay, em Paris, os salões dedicados à arte da África e da Oceania: 90% do que é exposto são utensílios de uso diário ou religioso. Hoje aumenta o número dos meus colecionadores, minhas fotos vêm ganhando preço no mercado de arte, mas não perco de vista o que faço. Como aquela foto da invasão do MST na Fazenda Giacometti, no Paraná, numa situação-limite, às 5 da madrugada, e eu ali, com um filme de 3200 ASA, quase sem luz para operar. Fiz um documento. Um dia o MST não terá mais força, ou desaparecerá, eu mesmo vou desaparecer, mas a fotografia permanecerá. Será referência da nossa sociedade, ganhando dimensão artística. Dizer que faço foto de arte, ah, isso não rola comigo. Porque sou repórter, tenho carteira de jornalista, nossa agência, a Amazonas Images, é de imprensa.

Como você mesmo diz, cresce o número dos seus colecionadores. Sebastião Salgado virou um clássico?
Estou me tornando. No Gênesis, pela primeira vez na vida admiti fazer fotografias com número limitado de reproduções. Porque sempre fotografei pessoas em suas situações de vida, jamais tive qualquer problema com direitos de uso de imagem e sempre distribuí minhas fotos em séries ilimitadas, o que reduz muito o preço delas. Agora quero lidar com número limitado de cópias, reproduções feitas em papel platinum, caras, porém maravilhosas. Creio que esse trabalho merece. Já fizemos algumas cópias e, no futuro, pretendemos lançar as séries limitadas. Aí, sim, será a estreia no mercado de arte.

Especialmente nas fotos de paisagem do Gênesis você parece mais formal, preocupado em mostrar texturas, realçar formas, captar nuances tonais.
Fui acusado de estetizar a miséria. E sabe por quê? Porque minhas fotografias sempre foram bem compostas. Sabe de onde vêm as texturas? Do filme de imprensa que sempre usei, o TRI-X, que dá grão. Quase só fotografo na contraluz e demorei a perceber isso. Um dia a Lélia montou uma exposição minha em Havana e um professor de uma escola de artes em Cuba veio visitá-la com os alunos. Eu o ouvi dizer a eles ‘este fotógrafo aqui só trabalha contra a luz’. Daí me toquei! Fazia aquilo instintivamente, sem me dar conta de que é na contraluz que se destacam os relevos, pois a zona de luz e sombra permite criar a noção de volume. Quando você me fala das paisagens que tenho feito, não significa que esteja procurando um estetismo na natureza. É que a natureza é profundamente estética.

Dê exemplos.
Fotografei os dois vulcões mais altos da placa euro-asiática, na península da Kamchatka, na Rússia, com mais de 4 mil metros de altura. Acordo de manhã, com aquelas nuvens fantásticas no céu, aquilo me deu a impressão de estar no fundo do mar enxergando o topo de uma montanha. Vi chuva de luz em Kamchatka, tal a beleza dos raios solares atravessando aquelas nuvens. Ora, não preciso ser esteta diante desse espetáculo. Procuro registrar os prístinos, locais no mundo onde poucos pisaram, então é natural que essas imagens nos provoquem sensações fortes. Como a foto que fiz de um iceberg na Antártica, que mais parecia um castelo medieval na Escócia, no entanto, trata-se de uma escultura mutante da natureza.

Mas você concorda que algumas dessas imagens beiram o abstrato?
Pode ser. A rigor, sou um esteta desde o início, porque não se esqueça de que a fotografia é uma linguagem formal: você tem um plano, tem um fundo, tem um sistema de linhas, é preciso organizar esse negócio. O bom fotógrafo é aquele que domina as suas variáveis.

Como é que você ‘ataca’ a cena? Porque as variáveis também são externas: por exemplo, nuvens dançam no céu. As patas dos animais movem-se pelas matas.
São tempos internos distintos. Dou como exemplo a foto que fiz da mão da iguana. Eu vi aquela pata, que é uma mão na verdade, com cinco dedos e tudo. E quis fotografá-la, mas teria de ser com uma lente macro, bem de perto, para captar o detalhe. A iguana como que autorizou a foto, porque, normalmente, é bicho que não aceita aproximação a menos de 2 metros. Tive que ir me chegando, de joelhos, com delicadeza: ela me observava, eu a observava; eu avançava um pouco mais, ela sabia que alguma coisa estranha iria acontecer, mas aceitava; daí finalmente fiquei bem perto daquela mão e fiz a foto. Aí fui recuando, rastejando para trás, bem devagar. E ela me observava. Quando uma foto como esta é finalmente feita, o cansaço que bate é total. Porque, ali, o fotógrafo sabe que tem a possibilidade de fazer uma fotografia incrível, mas, numa fração de segundos, poderá perdê-la. Ou não. São extenuantes essas situações.

É o "momento decisivo" de Cartier-Bresson?
Sim e não. Esse conceito é parcialmente válido para mim, porque trabalho noutra realidade. O conceito de "momento decisivo" em Cartier-Bresson é de corte representativo: só existe aquele momento, o antes não é bom, e o depois, também não. Para mim isso não é verdade. Penso num fenômeno fotográfico feito de aproximações e ajustes, um fenômeno em evolução, com envolvimento das pessoas, dos lugares, com muitas conexões, enfim.

Quando você olha suas fotos de publicidade reconhece nelas o mesmo Sebastião Salgado do Gênesis?
Claro. Nunca fiz foto de publicidade que eu não me sentisse realmente motivado a fazê-la. Isso vale também para meus tempos nas agências Gamma, Sigma, Magnum. Quando inauguraram o aeroporto de Malpensa, em Milão, fui contratado para fazer fotos de promoção do lugar, mal aceito pela população do norte da Itália. Seriam fotos para estampar pôsteres distribuídos pelo país. Adorei a encomenda, não só porque me pagaram uma fortuna, mas porque eu tive a oportunidade de conhecer o que cerca e envolve um aeroporto. E saí fotografando. Descobri uma "cidade" que emprega 15 mil pessoas. Tem de tudo lá: do pessoal da limpeza bruta ao pessoal dos ajustes mais finos. Vi as famílias desembarcando, o encontro dos parentes, fabulosas histórias de vida. Descobri um grupo de aposentados, fanáticos por avião, que passa os dias controlando o tráfego aéreo das cercas de arame que circundam Malpensa. Propus aos meus clientes que fizessem um livro com aquele material. E toparam. Foi uma experiência genial.

Como você se sente quando dizem que só faz fotografia engajada?
Isso é um comentário limitador. Não sou um fotógrafo militante, embora me engaje profundamente naquilo que eu faço, quase como forma de vida. O que é muito diferente. Tenho minha ideologia, que pode ou não ser aceita, e fotografo tudo, da natureza ao carro da montadora, com a mesma doação pessoal.

Como é fotografar gente célebre?
Fiz e ainda faço isso. São momentos especiais. Porque peço sempre um tempo maior para fazer portraits, não aceito correrias. Como no caso do retrato do Bill Clinton para a Vogue americana. Pedi uma semana com ele, se não fosse assim, nada feito. Muitas vezes fiquei amigo dos fotografados. Como no caso do Italo Calvino. O New York Times pediu um retrato dele, viajei até Roma, me instalei num hotel e fui para a casa do escritor. Apertei a campainha, Italo veio até a porta e perguntou se eu era o fotógrafo do Times. Daí indagou quanto tempo eu precisaria para o serviço, já dizendo que uma hora estaria de bom tamanho. Eu expliquei: "Não, preciso de três dias." Ele reagiu de pronto, disse que jamais daria três dias da vida dele para mim ou para o Times. E eu rebati, então não dá para fazer. Estávamos nessa discussão quando chegou a mulher dele, uma argentina decidida, e botou ordem no pedaço. Não só ordenou ao Italo que ficasse à minha disposição o tempo que fosse preciso, como ordenou que eu me mudasse para a casa deles. Fotografei-o em casa, pelas ruas de Roma, fui para a casa deles em Paris, assim nasceu uma amizade que durou a vida inteira do Italo. Retrato precisa de tempo. E quem me pede para fazer um já sabe disso.

E a sua fidelidade ao preto e branco? Justamente por andar pelo mundo fotografando paraísos, muita gente lhe cobra a foto em cor.
Preto e branco é o que sei fazer. E não sou o único. Tem uma porção de fotógrafos que continuam fiéis a isso. Vou citar apenas um: o Cristiano Mascaro, que é um megafotógrafo, só produz em preto e branco. Não sei fazer o que ele faz, mas tanto ele quanto eu nos identificamos com essa abstração. No P&B aprendi a lidar com densidade, a controlar a revelação, a fazer minhas reproduções e mesmo hoje, já inteiramente adaptado à tecnologia digital, sigo no mesmo caminho. Tanto que programo a máquina digital de tal forma que, através dela, só vejo em preto e branco. O descarte da cor se dá logo no início. Passei a minha vida aperfeiçoando, não vou abandonar isso agora.

No entanto, você fez a passagem da máquina analógica para a digital com tranquilidade.
Só mudei o suporte, porque o processo continua rigorosamente o mesmo. Trabalhei quase toda a minha vida com Leica, depois, como precisava de negativos maiores, passei para Pentax. E agora fotografo com Canon. Mas, digitais ou analógicas, as máquinas são as mesmas, como as lentes também.

Por que diz que o processo não mudou?
Explico: fotografo em digital, daí tenho dois assistentes que descarregam os cartões lá em Paris e preparam para mim os contatos. Só então começo a seleção de imagens, porque não sei vê-las em computador, necessito ter os contatos e os meus, sinceramente, são lindos. Bom, edito os contatos, tenho um assistente só para fazer as cópias de leitura, e daí entram outros dois assistentes, responsáveis pelas cópias finais. Sobre essas cópias fazemos negativos, pois se por acaso perder imagens no armazenamento digital, tenho lá meus negativos muito bem guardados.

A tecnologia da imagem poderá um dia subjugar o olhar do fotógrafo?
Não creio, principalmente num trabalho como o meu, que é jornalístico e depende da iniciativa pessoal. Só faz fotografia documental quem tem aquela "vontade de ir". Isso é fundamental. O resto são as tais variáveis que devemos aprender a dominar. Muitas vezes acordo de pesadelos em minha casa, em Paris, sem saber onde estou. Isso me dá aflição. Mas quando me encontro num canto remoto do mundo, a sensação que tenho é a de saber exatamente onde estou.

E a manipulação de imagem, hoje tão mais fácil, tão mais imperceptível e tão mais incontrolável no mundo digital? Isso é um pesadelo para você?
Mais ou menos grosseiras, manipulações de imagem sempre existiram, por que vou me preocupar com isso? A verdade do fotógrafo é aquela fração de segundo. Se fizerem manipulação sobre isso, então não estaremos mais falando de fotografia. Daí nem me compete opinar.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

segunda-feira, 20 de julho de 2009

No Mundo da Lua

No dia 24 de agosto de 2006, me encontrava em Flagstaff, Arizona, visitando o Observatório Lowell. Por uma dessas razões, que a própria razão desconhece, quis o destino que esse fosse o dia no qual a União Astronômica Internacional decidira pela exclusão de Plutão da lista de planetas do Sistema Solar. Justamente, naquela noite limpa e estrelada, cerca de 2.500 especialistas estavam reunidos em Praga, do outro lado do mundo, para decidir o destino de Plutão; e eu, ali, olhando pelo mesmo telescópio que, em 1930, auxiliara na descoberta do, então, 9º planeta do Sistema Solar.

Antes de continuar essa história, é necessário explicar algumas coisas a meu respeito. Amo o céu e as estrelas. Cresci em Brasília, no meio do Planalto Central. Garanto ao leitor que, no Brasil, céu mais lindo não há. O manto negro da noite, salpicado de luzinhas brilhantes, embalou meus sonhos de menina, meus desejos adolescentes e meus anseios de mulher. O mistério do infinito sempre exerceu especial fascínio sobre mim. Quando pequena, um de meus programas favoritos era ir ao Planetário de Brasília, nos fins de semana, e viajar ao espaço sideral - mesmo que fosse de mentirinha. Já vi até lançamento de foguete, ao vivo, pela janela do hotel, em Cabo Kennedy, hoje, Canaveral.

Quando morei nos Estados Unidos, acompanhei, com muito interesse, o lançamento do ônibus espacial Challenger, que se desintegrou 73 segundos após o lançamento, matando toda a tripulação, inclusive a primeira professora a participar de uma missão espacial, Christa MacAuliffe, fato que muito me chocou à época. E, adivinhem qual era o meu programa favorito de fins de semana e feriados... visitar o mais espetacular, o mais incrível museu dentre todos os museus maravilhosos que Washington acolhe: o National Air and Space Museum. Naves espaciais de verdade, fragmentos da lua (!!!), comidinhas de astronauta, planetário, toda a história das loucas tentativas do homem viajar pelo espaço, as descobertas científicas, o desenvolvimento da engenharia, da astronomia, isso sem contar toda a história da aviação, dos homens incríveis e suas maravilhosas máquinas de voar. A esta altura, acredito não espantar mais ninguém o fato de eu ter querido ser astronauta.

Neste ano de 2009, além de comemorarmos 40 anos da chegada do homem à lua, a UNESCO e a União Astronômica Internacional decidiram dedicar o ano à Astronomia, em homenagem a Galileu, que há 400 anos atrás apontou um telescópio para os céus e mudou a história da humanidade, afirmando e defendendo que a Terra não era o centro do univesrso. Por causa de suas descobertas, quase morreu queimado nas fogueiras da inquisição. Ah, essa Igreja, sempre fazenda das suas...Pois bem, chegamos ao ponto principal deste artigo: a negação da ciência.

Há exatos dois anos precisei ir tomar satisfações no ( hoje antigo) colégio da minha filha, por que o professor de ciências (?!) havia dito, em sala de aula, para aquelas crianças de sexta série, que o homem não havia ido à lua - que essa história era uma invenção americana da época da Guerra Fria. Caso de polícia. Se fosse em outro país, esse cidadão teria sido demitido sumariamente do colégio. Aqui, não: continua lá prestando um péssimo serviço à sociedade.

Adiantando um pouco o filme, acompanhei, na semana passada, a cobertura medíocre que a imprensa brasileira conseguiu dar aos 40 anos da chegada do homem à lua, em meio a escândalos de SirNey e seus comparsas. Fiquei chocada com o pouco caso e também com as 'opiniões' dos 'entendidos' que escreveram para as 'cartas dos leitores' do jornal local e sites da internet. Inacreditável!

Pensando melhor, não sei o motivo de ter ficado tão chocada com a negação da ciência. Um país que trata a educação e a ciência do jeito que o Brasil trata, só merece mesmo essa qualidade inferior de cidadãos. É próprio das sociedades atrasadas, que nada produzem, que não fazem nunca a diferença, um alto grau de obscurantismo. É mais fácil um brasileiro acreditar no Saci Pererê e na Mula-Sem-Cabeça do que em um homem ter pisado na lua.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

O Valor da Comunicação em Tempos de Negócios Globais

A palestra O Valor da Comunicação em Tempos de Negócios Globais aconteceu no dia 02 de julho último, no café do Expo Unimed, na Universidade Positivo. O foco principal do evento foi colocar o tema da comunicação transnacional, mediada pela língua e pela tradução, em pauta.

Abordei alguns temas relacionados às mudanças culturais, sociais e políticas relacionados à globalização dos mercados, à Internet e à interconectividade, a partir de comentários sobre o trailer do filme Babel. Meu objetivo foi contextualizar os impactos que essas mudanças acarretaram na nossa maneira de interagir, a partir da necessidade de as pessoas se comunicarem com culturas diferentes. Além disso, enfatizei as dificuldades do processo de comunicação transnacional e tentei trazer à tona o estranhamento e a diferença por meio de outros exemplos, como a apresentação de Jay Walker e o filme educativo da Australian Screen.

Falei sobre a comunicação empresarial transnacional e sobre como as empresas, no geral, estão pouco preparadas para lidar com os problemas de adaptação e adequação linguístico-cultural nos seus mercados-alvo. Apresentei o conceito de 'localização' seguido de alguns dados de pesquisa realizada pela Wordbank, empresa especializada neste tipo de serviço.

Encerrei a palestra fazendo um apanhado geral dos assuntos tratados e comentando a eterna busca do homem pelo entendimento através dos séculos. O eterno retorno a Babel.

Abrimos para comentários, trocas de experiências e perguntas e essa foi, sem dúvida, a melhor parte da noite. O público participou ativa e inteligentemente, superando todas as expectativas de participação.

O evento contou com a presença de aproximadamente 100 profissionais de áreas como marketing, comunicação e tradução, além de advogados, arquitetos e outros interessados no assunto. Todas essas pessoas tiveram a oportunidade de parar para pensar um pouco em como a tradução tem contribuído com a comunicação no mundo globalizado.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Spanglish - motivo de piadas do passado, nova língua ganha status de assunto sério

In un placete de La Mancha of which nombre no quiero remembrearme, vivía, not so long ago, uno de esos gentlemen who always tienen una lanza in the rack, una buckler antigua, a skinny caballo y un grayhound para el chase. Quem é familiarizado com os livros sabe tratar-se de um trecho de um dos maiores clássicos da literatura mundial: Don Quijote de La Mancha.
Êpa, espera aí, mas em que raios de língua está traduzido Cervantes? Um insulto a língua espanhola? Ou uma maneira rápida e eficiente de comunicação? E é aqui que começa a confusão.
As raízes do que hoje se conhece como Spanglish pode ser tão antiga quanto o Tratado de Guadalupe Hidalgo, em 1848, quando o México perdeu quase 2/3 de seu território para os Estados Unidos - detalhe importante: a população se foi com as terras. Quem conta essa história, baseada em pesquisas a respeito do assunto, é o professor Ilán Stavans em seu livro Spanglish: The Making of a New American Language, ainda sem tradução no Brasil. Stavans é professor do primeiro curso universitário de Spanglish na Amhearst University, em Massachusetts.
O Spanglish é uma mistura do espanhol com o inglês, como já se deve ter percebido. Entretanto, o mais curioso da história é que o que parece uma combinação aleatória de palavras escolhidas ao acaso, nos dois idiomas, é, na verdade, uma estratégia de comunicação. Quando um latino, morador do Bronx, diz: 'Te llamo para atrás' no lugar de 'I call you back' (numa tradução literal!) tem certeza de que será compreendido e isso, por si só, já é um grande indício de que a comunicação ocorreu sem ruído. Ou seja, para os participantes do processo de comunicação não há o estranhamento por conta da mistura de palavras em espanhol e inglês.
Em comunicação, chamamos esse processo de code-switch, ou troca de códigos. A troca de códigos, nesse caso, ocorre entre dois idiomas distintos, mas que fazem parte da mesma 'família', ou seja, a dos códigos linguísticos. É importante frisar que fazemos o code-switch constantemente e esse é um dos motivos que fazem com que a comunicação seja um processo fundamentalmente semiótico. Explico.
A capacidade humana de significar, de dar um sentido às coisas não é limitada pelos códigos, mas, sim, influenciada por eles - já que códigos são meios de transporte nos quais as mensagens vão e vem. A mensagem, que viaja para lá e para cá, seja em forma de palavras ou de imagens ou de fenômenos, não importa sua natureza, é transportada e transformada pelos códigos, mas o passo definitivo para sua compreensão é a interpretação e posterior significação que o receptor conferirá a ela.
No caso do Spanglish, quando um falante mistura os códigos linguísticos e tem certeza de que será entendido, ele conta com um outro fator que é o prévio conhecimento (ou será reconhecimento?) do código cultural que o aproxima do receptor da mensagem. Ser latino nos Estados Unidos significa muitas coisas que esses dois interlocutores simplesmente sabem. É o tal código não-escrito. A partir daí surgem mil e uma possibilidades não só de criação de novos símbolos (palavras incluídas!), como de novas significações.
Aliás, outra estratégia dos falantes do Spanglish é justamente criar novas palavras, como: rufo (que vem de roof, teto, em inglês), carpeta (carpet, em inglês e folder, em espanhol), ou parquear ( de to park, em inglês, quando o correto, em espanhol é estacionar). A lista de palavras é imensa e muito curiosa.
Tenho muito a dizer ainda sobre o Spanglish e também sobre novas línguas que têm surgido nesses tempos de globalização e internet, mas, hoje, fico por aqui.

terça-feira, 14 de julho de 2009

A importância de um nome

Huá Mei nasceu em San Diego, Califórnia, em 21 de agosto de 1999. Sua chegada foi muito festejada por seus pais, Bai Yun e Shi Shi, além de outras centenas de pessoas envolvidas direta e indiretamente com seu nascimento - afinal, de tantas outras tentativas anteriores sem sucesso, ela havia superado todas as adversidades e, finalmente, provado que a persistência da ciência não fora em vão. A imprensa do mundo inteiro noticiou a chegada do bebê e filas e mais filas de curiosos e entusiastas se formaram, semana após semana, do lado de fora da maternidade.
Conheci Huá Mei pessoalmente há quatro anos e posso afirmar que se trata de uma chinesinha gordinha, muito simpática e brincalhona. Comprei até um boneco de pelúcia feito especialmente para representá-la e o trouxe comigo para o Brasil. Assim como eu e minha família, várias outras famílias, do mundo inteiro, visitam-na todos os anos e também levam para suas casas Huá Mei de pelúcia e espalham sua história pelos quatro continentes.
O que Huá Mei tem de especial que desperta tanto interesse em pessoas de diferentes culturas e línguas se sua história é apenas mais uma, entre tantas, numa época na qual a ciência já venceu tantas batalhas referentes à reprodução assistida? A minha explicação: um nome que carrega sua história. Se esse filhote fêmea de urso panda não tivesse recebido um nome e junto com ele não fosse contada uma história, por mais simples que ela pareça, aposto que não haveria destaque nas manchetes dos jornais e revistas e que os visitantes do zoológico passariam com cara de paisagem pelo viveiro e não gastariam seus dólares comprando mais um bicho de pelúcia para ficar empoeirado no baú de brinquedos.
O nome distingue os seres de mesma espécie, carrega histórias e permite a perpetuação no tempo. Isso vale não só para seres e lugares, mas também para coisas e sentimentos.
Dar nome às coisas faz parte da cultura americana. As florestas têm nome, assim como as árvores nos parques, as montanhas, os vales, os picos, as cavernas, as trilhas, etc. No Parque Nacional das Sequóias Gigantes, na Califórnia, cada árvore tem seu nome: General Grant, General Lee, General Sherman...As crianças (e os adultos também!), quando visitam o parque, aprendem várias coisas sobre geografia, geologia, plantas e animais, conservação do meio ambiente, e, claro, história americana. Vivendo as histórias e as emoções que os nomes carregam, americaninhos e americanões se apossam de seu passado, presente e futuro e gravam em seus corações a grandeza e exuberância de seu país.
No Brasil, tudo parece muito diferente. Não sabemos o nome das coisas e isso não nos faz falta. Desafio você, que está lendo esse texto, a dizer o nome de um bicho qualquer do zoológico da sua cidade (se é que você já foi lá); ou de alguma árvore do parque que você frequenta; ou, talvez do teatro mais antigo do Brasil. Esqueceu, ou nunca soube?
Outra coisa comum para nós brasileiros é polarizar os estados da alma entre 'felicidade' e 'tristeza', como se nada houvesse entre esses dois pólos: decepção, angústia, frustração, solidão, espanto, expectativa, são sentimentos riscados de nosso vocabulário - cada vez mais restrito a mesma meia dúzia de palavras vazias, repetidas à exaustão. O perigo é que, por falta de um nome apropriado, os sentimentos, eles próprios, deixem de existir também.
De uns tempos para cá, além de não darmos a mínima importância para a denominação de seres, lugares e objetos, estamos desenvolvendo um estranho hábito de tentar mudar, inclusive, o nome genérico das coisas. Outro dia ouvi uma conhecida dizer que mudara a denominação de seu negócio de 'padaria' para 'confeitaria' porque achava que a palavra 'padaria' depreciava seu estabelecimento. Já ouvi também que era melhor encontrar outra denominação para 'museu' porque a palavra por si só já poderia espantar as pessoas (ahn?! como assim?).
É um espanto!

domingo, 10 de maio de 2009

Feliz Dia das Mães!

Como mãe de duas crianças, não poderia deixar passar em branco o dia das mães. Independentemente de algumas pessoas serem contra essas datas comemorativas por considererá-las comerciais demais, acredito que seja saudável ter data marcada para todas as coisas da vida. O motivo é simples: se não temos a data certa, relaxamos o compromisso.

Vamos aproveitar este dia para beijar nossas mães e avós, para lhes dizer o quanto as amamos, o quanto elas são importantes em nossas vidas e o quanto devemos a elas muito do que somos. Para quem não tem mais sua mãe por perto, ofereça uma oração a ela, lh dedique um pensamento. Mães são para serem amadas, todos os dias.

Feliz dia das mães a todas essas maravilhosas mulheres que criam a vida!

O Cântico da Terra
Cora Coralina

Eu sou a terra, eu sou a vida.
Do meu barro primeiro veio o homem.
De mim veio a mulher e veio o amor.
Veio a árvore, veio a fonte.
Vem o fruto e vem a flor.

Eu sou a fonte original de toda vida.
Sou o chão que se prende à tua casa.
Sou a telha da coberta de teu lar.
A mina constante de teu poço.
Sou a espiga generosa de teu gado
e certeza tranqüila ao teu esforço.
Sou a razão de tua vida.
De mim vieste pela mão do Criador,
e a mim tu voltarás no fim da lida.
Só em mim acharás descanso e Paz.

Eu sou a grande Mãe Universal.
Tua filha, tua noiva e desposada.
A mulher e o ventre que fecundas.
Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.

A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu.
Teu arado, tua foice, teu machado.
O berço pequenino de teu filho.
O algodão de tua veste
e o pão de tua casa.

E um dia bem distante
a mim tu voltarás.
E no canteiro materno de meu seio
tranqüilo dormirás.

Plantemos a roça.
Lavremos a gleba.
Cuidemos do ninho,
do gado e da tulha.
Fartura teremos
e donos de sítio
felizes seremos.


quarta-feira, 29 de abril de 2009

O impressionante crescimento das redes sociais

Sou uma entusiasta das tecnologias da comunicação, em geral, e da Internet, em particular. Como uma profissional de comunicação, não poderia ser diferente - apesar de conhecer diversas pessoas da área que se vangloriam de não gostar de tecnologia e preferir, por exemplo, escrever textos em máquinas Olivetti. Particularmente, não acredito nisso. Acho que essas pessoas só querem mesmo é fazer charme. Duvido que ainda achem para comprar aquelas fitas vermelho e preta, cheias de tinta. E, outra coisa, quem é que gosta de ter que datilografar (isto mesmo, datilografar!) um texto todo por ter errado no final? Alguém pode me dizer?


Pois bem, voltando ao assunto, quero dizer que ando algo intrigada e também surpresa com alguns dados divulgados recentemente na WWW sobre o crescimento exponencial das redes sociais. Mamma mia! Nunca imaginei que as pessoas tivessem tanto interesse umas nas outras! Eu que sempre fui um tanto quanto cética em relação a esses papos de 'comunidades unidas por uma causa em comum', acho melhor começar a rever meus conceitos.


Para começarmos certo, acho melhor explicar o que são as redes socias. As redes sociais ou social networks são redes de comunicação criadas a partir de sites de relacionamento, que permitem que pessoas e empresas troquem informações, partilhem conhecimento, idéias, valores, interesses e objetivos comuns. Ou seja, são 'espaços' na Internet que permitem que usuários de toda e qualquer parte do planeta interajam com outros usuários em qualquer outra parte deste mesmo planeta.


A idéia por si só já é fascinante - não somente pelo fato de se alcançar uma outra pessoa a quilômetros de distância, pois o telefone, o fax e o e-mail já fazem isso há décadas - mas sim porque podemos interagir, em tempo real, com quem quer que seja. São exemplos de redes sociais: Orkut, Facebook, Twitter, MySpace, entre outros.


Pois bem, as redes sociais também são mídias sociais, com poderes de broadcast e de 'contaminação viral'. A grande questão em pauta é o poder que passou das mãos dos veículos das chamadas mídias tradicionais para as mãos dos usuários e redes por eles criadas nas mídias digitais - são eles, os usuários, que definem com quem querem se 'associar' para compartilhar o que quer que seja. A conseqüência disso é a perda de visibilidade e importância, aos olhos dos internautas, das empresas que mantenham uma mera presença na Internet com sites cheios de informações, fotos e fatos. Isso porque não adianta manter uma página na WWW se ela não é visitada. E, para que as visitas aconteçam, tem-se que alimentar a página todos os dias com novidades. Mas, alimentar com o quê, se o internauta das redes só vê e ouve o que lhe interessa? E, afinal, quem é esse internauta? Do que gosta? O que está procurando?


Percebe-se que as respostas para as perguntas acima passam, necessariamente, por mais tecnologia e novas e sofisticadas estratégias. Tarefa nada fácil para a grande maioria das empresas que não tem condições financeiras de investir grandes quantias $$ em tecnologias sofisticadas de bancos de dados e CRMs que conversem com as redes sociais. Além disso, falar em estratégia para empresas brasileiras é sempre um perigo. Por aqui é comum se gerenciar os negócios com o foco apenas no jantar, ou seja, no curtíssimo prazo. Outro ponto negativo que afeta as empresas brasileiras é que, em pleno século XXI, o país mantém os impostos sobre os produtos tecnológicos na estratosfera. Mas, deixemos as nossas agruras de lado...


Hoje, a realidade é que se as empresas não enxergarem que precisam de estratégias robustas e consistentes para atuarem nas redes sociais, com públicos altamente segmentados, com interesses e objetivos dos mais diversos, correm o risco de tornarem-se invisíveis mesmo investindo quantias consideráveis $$ dentro e fora da WWW.


As empresas mais 'antenadas' e ágeis estão correndo para reformular suas estratégias de marketing e comunicação, bem como seus sistemas de informação. Está havendo uma corrida alucinante de empresas para as redes sociais, que se tornaram uma verdadeira mina de oportunidades para aqueles que já entenderam sua importância, e as utilizam como canal de comunicação direta com clientes.


Abaixo, alguns números divulgados recentemente pelo site www.mashable.com em relação ao crescimento das redes sociais:



  • Facebook – É atualmente o 1º do ranking dos sites de relacionamento e continua a crescer. Ultrapassou o MySpace - só em março foram 69,1 milhões de visitantes. Em menos de 8 meses, pulou de 100 para 200 milhões de usuários. Se fosse um país, seria maior do que o Brasil;

  • MySpace – já foi o primeiro site de relacionamento do ranking, mas perdeu a posição para o Facebook. Atualmente está em 2º lugar.

  • LinkedIn – uma das redes sociais que mais cresce. Dobrou de tamanho no último ano - são mais de 15,8 milhões de pessoas só nos USA. É o terceiro maior site de relacionamento no ranking, atrás apenas do Facebook e do MySpace.

  • Twitter - teve crescimento de 2.565 %. Alcança, atualmente, mais de 13 milhões de pessoas/mês nos USA– apenas o website (sem contar usuários do TweetDeck ou do Seesmic Desktop).

Em relação aos investimentos que as empresas fizeram nas redes sociais (Mudanças nos Investimentos em Mídia Social 2009, de acordo com a Best in-class Companies Worldwide - % de entrevistados) os números são os seguintes:



  • 21% dos entrevistados responderam que aumentaram seus orçamentos em 25% ou mais;

  • 16% responderam que aumentaram entre 11% e 25%;

  • 26% responderam que aumentaram entre 1% e 10%;

  • 34% responderam que mantiveram seus orçamentos;

  • 3% disseram que diminuiram seus orçamentos entre 1% e 10%;

  • 0% diminuiram entre 11% e 25% e,

  • 0% diminuíram mais de 25%.


Não é mesmo de assustar?

sábado, 18 de abril de 2009

Libras - A Língua Brasileira de Sinais


Gosto da idéia de aprender alguma coisa nova todos os dias. Aumentar o repertório é muito importante para alguém que,como eu, se dedica a pensar sobre comunicação. Além disso, é muito divertido e faz com que qualquer um se torne uma pessoa mais interessante.

Sempre me intrigou observar a conversa dos deficientes auditivos*. Costumo encontrar alguns grupos muito animados na porta dos cinemas ou passeando pelos shoppings. Muitos gestos e expressões incríveis pontuam as conversas, e, mesmo para quem não é versado em língua de sinais, algumas mensagens podem ser facilmente entendidas com um pouco de atenção e perspicácia. Várias vezes me peguei 'encarando' as pessoas para tentar entender um pouco seus gestos e, com isso, traduzi-los para a linguagem 'falada' - mas logo batia aquele constrangimento em pensar que poderia ser mal compreendida e passar por indelicada.
Ano passado, em uma das disciplinas do mestrado, conheci um colega na UFSC que pretendia fazer sua dissertação justamente sobre tradução de língua de sinais. Ficamos amigos e logo aprendi muitas coisas novas sobre o assunto.

Uma das primeiras coisas que aprendi foi que existe uma língua de sinais brasileira - a LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais). Até então, eu não sabia que cada país possui sua própria língua de sinais. Por exemplo, na Inglaterra tem-se a BSL (British Sign Language), nos Estados Unidos a ASL (American Sign Language), e assim por diante. E, como em toda língua viva, cada região de um mesmo país tem sua maneira de falar, suas gírias, seus ditados, etc. e tal. Atribui-se às Línguas de Sinais o status de 'língua' porque elas também são compostas pelos níveis lingüísticos: o fonológico, o morfológico, o sintático e o semântico.
A comunicação por meio da língua de sinaisnão é feita com palavras, mas por meio de conceitos, e não há uma correlação direta desses conceitos com a língua falada. Embora seja possível para um profissional treinado em interpretar a linguagem dos sinais traduzi-la para uma língua falada qualquer, tal interpretação não seria uma tradução direta, pois o jeito como uma pessoa sinaliza um conceito pode significar mais do que o sinal em si. O processo transcorre como na língua falada: a maneira como você vocaliza uma palavra e as expressões facias e o gestual que a acompanham podem transformar seu significado.

A história da LIBRAS começou ainda no Império, em 1856, com o conde francês Ernest Huet, que era surdo, e desembarcou no Rio de Janeiro com o alfabeto manual francês e alguns sinais. O material trazido pelo conde foi adaptado e deu origem à LIBRAS, cujo sistema foi amplamente difundido e assimilado no Brasil.
Por incrível que pareça, a LIBRAS só foi oficializada no país um século e meio depois, em abril de 2002. Nesse período, o Brasil trocou a monarquia pela república, teve seis Constituições e viveu momentos difíceis com a ditadura militar.

Em 1951, ocorreu o Congresso Mundial da Federação Mundial dos Surdos, no qual foi proposta a criação de uma linguagem unificada de sinais para facilitar a comunicação dos surdos no mundo todo. Em 1973, houve a tentativa de se criar um vocabulário de sinais padronizados. Esse vocabulário foi batizado de Gestuno, palavra de origem italiana que significa 'linguagem de sinal unificado'. A Gestuno contava, na época, com mais de mais de 1.500 sinais. Atualmente, a Gestuno é conhecida como a Linguagem Internacional de Sinais (ISL) e, apesar de usar um vocabulário padronizado, não há padronização gramatical ou de uso. Assim como o Esperanto, a ISL não 'pegou' e ficou longe de revolucionar a comunicação internacional, como se pretendia. A ISL não obedece o ritmo evolutivo das línguas naturais de sinais simplesmente porque foi uma língua criada artificialmente.

Somente em agosto de 2001, por meio do Programa Nacional de Apoio à Educação do Surdo, foram formados no Brasil os primeiros 80 professores preparados para lecionar a língua brasileira de sinais. A regulamentação da Libras em âmbito federal só se deu em 24 de abril de 2002, com a lei n° 0.436.

Caso você tenha gostado do artigo, não deixe de comentar. caso queira saber mais sobre o assunto, acesse: www.libras.org.br .

* O meu amigo, especialista em LIBRAS, me disse que os surdos gostam de ser chamados de surdos. Mas, por precaução, achei melhor optar pela expressão 'deficientes auditivos' antes que me acusem de preconceituosa.
PS: Não sei o que está acontecendo, mas não consigo formatar esse texto de forma alguma. Desisto!

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Novos Códigos, Novas Línguas, Nova Comunicação


A popularização da Internet, os hipertextos [1], os e-mails, as mensagens instantâneas, as redes sociais [2], entre outras ferramentas da era da comunicação interativa, trouxeram à tona questões complexas relativas à codificação, recepção, interpretação e significação de textos e/ou mensagens.


Cada vez mais os indivíduos precisam ser “iniciados” em códigos e “línguas” específicos, para que possam fazer parte de determinadas redes sociais e ser capazes de se comunicar com outros indivíduos.

Esses códigos e línguas, não compartilhados nem mesmo num ambiente que poderia constituir uma única cultura, fazem parte de um arsenal de novas habilidades necessárias para que os indivíduos sejam capazes de se comunicar com os grupos sociais aos quais pretendam pertencer. Sem a aquisição dessas novas habilidades, a capacidade de comunicação torna-se cada vez mais limitada, assim como a capacidade interpretação, de significação e de leitura.

Um exemplo que se pode dar é o da “língua” denominada MIGUXÊS, socialeto do português, utilizado comumente por adolescentes lusófonos para mandar mensagens na Internet e em outros meios eletrônicos, tais como os telefones celulares. O nome miguxês deriva de miguxo, corruptela de amiguxo, por sua vez um termo utilizado para “amiguinho”. O miguxês vem sofrendo transformações (ou serão evoluções?) desde quando surgiu:

- Português: Amiga, vou dormir. Um abraço para você!
- Dialeto (ICQ) [3]
ou Miguxês Arcaico: amiga, vou dormir. 1 abraco pra vc!!
- Dialeto (MSN)[4]
ou Miguxês Moderno: miga... vo dormi... 1 abrassu p vc!!!!!
- Dialeto (ORKUT) ou Neo-Miguxês: mIguxXxaH... vow MiMi......1 AbraXXU PRah VUxXxE!!!!!

O miguxês conta atualmente com um tradutor automático on-line português/ miguxês para ajudar os não-iniciados a aprender um pouco mais sobre a “língua” [5].

Entretanto, o miguxês não anda sozinho quando o assunto é comunicação on-line. As línguas que circulam na Internet contam com ícones (emoticons)[6]a fim de representar, por exemplo, emoções, atitudes, características fisionômicas, peças do vestuário, entre outras coisas:

EMOTICON TEXTUAL/ SIGNIFICADO

:D Risada

B) Óculos escuros
:) Feliz.Sorriso
:( Triste
;) Piscadela
:B Mostrando os dentes
:x Boca fechada
:* Beijo
:o) Nariz de palhaço
:T Mascando chicletes
:~~ Lágrimas

Note-se que, nos emoticons, elementos do código escrito são completamente ressignificados. Os sinais de pontuação adquirem “vida própria” e, com isso, função e significação diversa daquelas que lhes eram originais - são signos “mutantes”, que só podem ser lidos, significados e interpretados por aqueles que dominam e compartilham deste código no ato da comunicação.

Um internauta utiliza-se de vários códigos e signos ao mesmo tempo para se comunicar virtualmente com seus pares: é a mistura de códigos orais, sonoros, escritos, pictóricos e icônicos que possibilita a criação e troca de mensagens no mundo virtual. Essas misturas espontâneas de códigos não seguem um padrão regular e dependem intrinsecamente das pessoas que estão “conversando”, do momento em que essa conversa ocorre e da comunidade na qual o “papo” está se desenrolando. Ou seja, mais do que nunca, a comunicação é resultante de uma combinação única de fatores que determinam não só suas características, mas toda a sua estrutura.

A Internet e as mensagens que circulam em internetês [7] trazem novamente à tona a fundamental importância do código na comunicação, porque resgatam o dialogismo da oralidade, a conversa cara-a-cara e a informalidade do diálogo que estimula a imaginação dos que compartilham o momento da comunicação; elas resgatam a espontaneidade da comunicação livre, a cumplicidade entre aqueles que “dialogam”, e, por isso, causam a impressão de ajudar a formar vínculos emocionais entre as pessoas – mesmo que essas sejam apenas falsas sensações do jogo de representação da realidade.

Isso tudo, combinado, dá aos indivíduos uma sensação de liberdade de expressão inigualável e nunca alcançada pelas pessoas comuns submetidas às regras formais das línguas já estabelecidas e aceitas como “reais”.

E você, já parou para pensar sobre essa nova forma de comunicação?

[1] Hipertexto: um texto digital ao qual se agregam outros conjuntos de informações (outros textos, imagens, sons), cujo acesso se dá através de referências específicas chamadas de hiperlinks.
[2] As chamadas redes sociais são responsáveis pelo compartilhamento de valores, idéias e objetivos entre pessoas que se identificam umas com as outras. As redes já existiam antes da Internet, porém, dada a sua capacidade de acelerar a comunicação, tornando-a ampla e veloz, as redes sociais se tornaram muito populares no mundo virtual. Alguns exemplos de redes sociais: ORKUT, LinkedIn, Hi-5, Plaxo, etc.
[3] ICQ: programa pioneiro de comunicação instantânea pela Internet, lançado em 1997. ICQ é um acrônimo, em português, da pronúncia de I seek you, em inglês.
[4] MSN Messenger: programa de mensagens instantâneas (em tempo real) lançado pela Microsoft Corporation em 2000.
[5] O tradutor português/miguxês está disponível no endereço: http://www.coisinha.com.br/miguxeitor/
[6] Emoticons: Forma de comunicação paralingüística, derivada da junção dos termos em inglês: emotion (emoção) + icon (ícone).
[7] Internetês: neologismo que designa as línguas e/ou linguagens que circulam nos meios virtuais de comunicação.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Nas Nuvens


Se você é dono de uma empresa - e não importa o tamanho -, ou um executivo de uma grande empresa, e seu trabalho é proporcionar o ambiente adequado para que os funcionários desempenhem bem suas funções, sabe o quanto é dispendioso e um tanto quanto complicado agregar um novo profissional à sua equipe.

Não falo nem das questões relativas à seleção da pessoa certa - coisa cada vez mais difícil, haja vista o nível de educação e treinamento que andam dando por aí -; nem tampouco da burocracia trabalhista que infesta os ambientes corporativos no Brasil. Me refiro a algo mais prosaico, como a aquisição de computadores, licenças de software e novos aplicativos, que são imprescindíveis para que se possa oferecer as condições necessárias para que o novo profissional desempenhe suas funções satisfatoriamente.

Pois bem,seus problemas acabaram! A boa notícia é que já existe uma tecnologia disponível e muito interessante para ajudá-lo a solucionar esses problemas, e a única coisa que precisará ser feita é carregar uma aplicação. Isso mesmo, uma única aplicação! Essa aplicação permitirá que os funcionários acessem um serviço baseado na Web, que hospeda todos os programas necessários para que ele faça seu trabalho.

A coisa funciona assim: servidores remotos, de propriedade de outras empresas, farão todo o trabalho de fornecer os programas, administrar os serviços e os espaços de armazenagem de informações e atualizar o que for preciso. Esses serviços vão desde e-mails ou processadores de texto, até programas complexos de análise de dados. A essa nova tecnologia, deram o nome de 'clouding computing', e muito tem se falado que esse pode vir a ser o grande salto revolucionário de toda a indústria da tecnologia para os próximos anos. Mas, como?

As vantagens são muitas, mas posso enumerar as duas principais:

  • Os computadores locais não precisarão mais rodar aplicações, o que faz com que possam ter configurações de hardware mais simples. Isso, em tese, os tornaria mais baratos para as empresas;

  • A demanda por hardware e software tende a diminuir, pois a única necessidade real seria um software de interface com o sistema, o qual é tão simples quanto um web browser (vide o seu próprio Internet Explorer ou similar).

É bem provável que você já tenha tido contato com alguma tecnologia de 'cloud computing' e ainda não tenha se dado conta disso. Por exemplo, o Hotmail e o GMail são bons exemplos de como a coisa toda funciona: ao invés de você rodar um programa de e-mail no seu computador, você faz o log in no sistema dessas empresas e acessa suas mensagens remotamente. Em consequencia, o software, o espaço necessário para o armazenamento das informações sobre a sua conta e as suas mensagens não estão na sua máquina, mas nos servidores desses prestadores de serviço.

Por essas e outras é que eu amo todos os nerds e loucos que ficam horas e horas a fio maquinando como tornar nossas vidas mais fáceis.



segunda-feira, 30 de março de 2009

Tryvertising - uma experiência e tanto para os consumidores e um grande retorno para as empresas



Se você é um daqueles gerentes de produtos cansados de utilizar as mesmas técnicas de pesquisa de mercado e testing de novos produtos, ou daqueles consumidores que adoram experimentar produtos em lojas ou ganhar amostras grátis, este artigo é para você.

Já imaginou poder testar, antes de qualquer ser humano do planeta, aquela banheira de hidromassagem enooormee cheia de aparatos tecnológicos de última geração, ou aquele iogurte cheio de propriedades rejuvenecedoras que a fará a mais linda e jovem das criaturas com apenas algumas semanas de uso? E, ainda por cima, se você desejar,tudo isso no mesmo lugar? Tipo assim, enquanto você toma seu banho tecnológico, experimenta o iogurte rejuvenecedor. Ou vice versa, você que manda. Os seus desejos acabaram de ser atendidos pela Alliant International University com o Sample-U, em San Diego, na Califórnia.

A idéia de um centro de experiências e 'experimentação' dedicado aos consumidores foi concebida a partir da constatação de que os resultados obtidos por meio de técnicas de focus group e/ou de ações de amostragem de produtos em pontos de venda já não geravam as respostas necessárias às empresas em relação à aceitação de novos produtos ou melhorias naqueles já existentes - do ponto de vista dos consumidores, claro, que é quem realmente importa, em marketing.

O Sample-U é um centro de experiências e experimentações, disponível aos Gerentes de Produtos que desejem utilizá-lo como parte de suas estratégias de pesquisa para desenvolvimento e testes de novos produtos e/ou melhorias e avanços em produtos existentes. Os consumidores são selecionados e/ou convidados a irem ao centro experimentar coisas novas, responder a algumas perguntas, dar suas opiniões, primeiras impressões e sugestões de melhoria às empresas, além de poderem, em alguns casos, levar os produtos para casa para continuar com os testes e discutir e compartilhar a experiência com amigos e família.

O conceito por trás desta nova modalidade interativa na concepção de novos produtos, que mistura pesquisa em tempo real com promoção é relativamente novo; e parece ter chegado para ficar. Os gerentes de produtos, há muito, perceberam que precisavam ganhar tempo e serem mais ágeis entre P&D, as pesquisas de marketing para lançamento dos produtos e a comercialização propriamente dita.

Essa nova modalidade interativa de marketing permite que elementos do marketing mix sejam modificados ou adequados às necesidades e desejos do consumidor, em tempo real, enquanto o produto ainda está em processo de desenvolvimento. Além disso, a empresa já inicia a divulgação entre os grupos de consumidores que participam interativamente do processo, gerando grupos de discussão em seu site, em redes sociais e onde mais a imaginação permitir.

Um detalhe muito importante é que o centro de experimentações, por fazer parte de uma universidade, utiliza-se da expertise de professores e alunos pesquisadores que conduzem os estudos, os analisam e devolvem às empresas. Isso traz benefícios indiscutíveis às universidades, aos pesquisadores e ainda mais benefícios às empresas que têm os custos de pesquisa e desenvolvimento sensivelmente reduzidos.

Outra qualidade inovadora do tryvertising - como vem sendo chamada essa nova modalidade de marketing interativo - é fazer com que o consumidor-testador inicie o processo de fidelização às marcas e aos produtos antes mesmo deles existirem efetivamente para o restante do mercado. Os tryvertisers têm o potencial de transformarem-se em um exército de multiplicadores muito eficientes da imagem de uma empresa ou produto. Afinal, quem não vira fã de algo que ajudou a conceber?

segunda-feira, 16 de março de 2009

Ao vencedor, nadica de nada

Culturalmente, não somos um povo adepto ao mérito. Temos verdadeira paúra a ter que competir para merecer o que quer que seja: uma vaga na universidade, uma posição melhor na empresa que trabalhamos ou até mesmo um aumento no salário do fim do mês. Competir, para nós, tornou-se a raiz de todo o mal, e, merecer, virou direito adquirido.


Afinal, competir para quê? Fazemos parte de "um povo sofrido, alegre e boa gente", que faz samba sobre suas desgraças, ri das próprias contravenções, zomba dos honestos, protege bandidos e reelege, seguidamente, corruptos, em troca de pequenos favores.


Um povo assim, tão especial, não merece ter que se submeter a uma prova de conhecimentos para entrar na universidade, um concurso eliminatório para assumir uma vaga em instituições públicas ou ser avaliado em sua produtividade para subir na carreira. Não... Merecemos mesmo é ser indicados ou nomeados, por decreto.


Temos até uma expressão, que se tornou bem popular nos últimos anos, aquela mesma, "ninguém merece", que é usada para expressar o nosso sentimento de insatisfação ou de injustiça quando algo nos é exigido além daquilo que estamos dispostos a oferecer de bom grado - tempo, paciência, ou o que quer que seja. Note-se que a expressão é politicamente corretíssima: não sou eu (o egoísta) quem não merece, mas sim, ninguém merece. Até nisso somos generosos...


Merecimento, aqui, também é sinônimo de punição - como naquela nossa velha e bem conhecida outra expressão, vingativa, mesquinha e invejosa- "bem que mereceu" - geralmente vociferada quando alguém bem-sucedido se dá mal.


Nas escolas não se pode reconhecer que um professor seja melhor do que outro - isso não é justo com o coitado que ganha pouco, mora mal e que, por isso, dizem, é mau profissional, adepto da lei do menor esforço e não cumpre sua obrigação de ensinar.


Uma criança não pode se destacar e ser melhor do que outras, nem em sala de aula, nem nos esportes, nem em nada. Logo surge o exército de guardiões da mediocridade, sempre de prontidão, para reprimir os talentos e as inteligências. Não é aceitável termos uma sociedade competitiva. Os nossos "educadores", politicamente corretos, em seu próprio favor, são os guardiões contra qualquer tipo de competição - não seria saudável emocionalmente para uma criança ter que competir para se destacar. Nossos "educadores" preferem perpetuar o jogo do ninguém é melhor que ninguém, porque, assim, estão sempre protegidos pelo manto da mediocridade. Aliás, esse também é o discurso preferido de outros "segmentos da sociedade".


Em nome da "justiça social", nivelamos todos e tudo sempre por baixo. Exigimos cada vez menos; protegemos e premiamos o incapaz, o ineficiente e o pouco esforçado, e deixamos de reconhecer os verdadeiros talentos, aqueles que fazem a diferença por onde quer que passem.


As conquistas individuais - na maioria das vezes patrocinadas unicamente por esforço e dinheiro próprios daqueles que nunca foram reconhecidos pela sua pátria amada, Brasil - são imediatamente tomadas do vencedor como sendo de todos, do povo brasileiro (tão sofrido, blá,blá,blá). Depois do momento de glória, mais uma vez o esquecimento. Os exemplos são tantos e tão tristes que me pouparei de apontá-los.



Não somos todos iguais. Alguns de nós são e sempre serão melhores e mais capazes do que outros. Ainda bem!