Huá Mei nasceu em San Diego, Califórnia, em 21 de agosto de 1999. Sua chegada foi muito festejada por seus pais, Bai Yun e Shi Shi, além de outras centenas de pessoas envolvidas direta e indiretamente com seu nascimento - afinal, de tantas outras tentativas anteriores sem sucesso, ela havia superado todas as adversidades e, finalmente, provado que a persistência da ciência não fora em vão. A imprensa do mundo inteiro noticiou a chegada do bebê e filas e mais filas de curiosos e entusiastas se formaram, semana após semana, do lado de fora da maternidade.
Conheci Huá Mei pessoalmente há quatro anos e posso afirmar que se trata de uma chinesinha gordinha, muito simpática e brincalhona. Comprei até um boneco de pelúcia feito especialmente para representá-la e o trouxe comigo para o Brasil. Assim como eu e minha família, várias outras famílias, do mundo inteiro, visitam-na todos os anos e também levam para suas casas Huá Mei de pelúcia e espalham sua história pelos quatro continentes.
O que Huá Mei tem de especial que desperta tanto interesse em pessoas de diferentes culturas e línguas se sua história é apenas mais uma, entre tantas, numa época na qual a ciência já venceu tantas batalhas referentes à reprodução assistida? A minha explicação: um nome que carrega sua história. Se esse filhote fêmea de urso panda não tivesse recebido um nome e junto com ele não fosse contada uma história, por mais simples que ela pareça, aposto que não haveria destaque nas manchetes dos jornais e revistas e que os visitantes do zoológico passariam com cara de paisagem pelo viveiro e não gastariam seus dólares comprando mais um bicho de pelúcia para ficar empoeirado no baú de brinquedos.
O nome distingue os seres de mesma espécie, carrega histórias e permite a perpetuação no tempo. Isso vale não só para seres e lugares, mas também para coisas e sentimentos.
Dar nome às coisas faz parte da cultura americana. As florestas têm nome, assim como as árvores nos parques, as montanhas, os vales, os picos, as cavernas, as trilhas, etc. No Parque Nacional das Sequóias Gigantes, na Califórnia, cada árvore tem seu nome: General Grant, General Lee, General Sherman...As crianças (e os adultos também!), quando visitam o parque, aprendem várias coisas sobre geografia, geologia, plantas e animais, conservação do meio ambiente, e, claro, história americana. Vivendo as histórias e as emoções que os nomes carregam, americaninhos e americanões se apossam de seu passado, presente e futuro e gravam em seus corações a grandeza e exuberância de seu país.
No Brasil, tudo parece muito diferente. Não sabemos o nome das coisas e isso não nos faz falta. Desafio você, que está lendo esse texto, a dizer o nome de um bicho qualquer do zoológico da sua cidade (se é que você já foi lá); ou de alguma árvore do parque que você frequenta; ou, talvez do teatro mais antigo do Brasil. Esqueceu, ou nunca soube?
Outra coisa comum para nós brasileiros é polarizar os estados da alma entre 'felicidade' e 'tristeza', como se nada houvesse entre esses dois pólos: decepção, angústia, frustração, solidão, espanto, expectativa, são sentimentos riscados de nosso vocabulário - cada vez mais restrito a mesma meia dúzia de palavras vazias, repetidas à exaustão. O perigo é que, por falta de um nome apropriado, os sentimentos, eles próprios, deixem de existir também.
De uns tempos para cá, além de não darmos a mínima importância para a denominação de seres, lugares e objetos, estamos desenvolvendo um estranho hábito de tentar mudar, inclusive, o nome genérico das coisas. Outro dia ouvi uma conhecida dizer que mudara a denominação de seu negócio de 'padaria' para 'confeitaria' porque achava que a palavra 'padaria' depreciava seu estabelecimento. Já ouvi também que era melhor encontrar outra denominação para 'museu' porque a palavra por si só já poderia espantar as pessoas (ahn?! como assim?).
É um espanto!
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